24 de junho de 2012

“Eu quis ele por uma aventura, uma risada, uma distração.
Depois quis o colo dele para sempre.”
Tati Bernardi.


“Se era amor? Não era. Era outra coisa.
Restou uma dor profunda, mas poética. Estou cega, ou quase isso: tenho uma visão embaraçada do que aconteceu. É algo que estimula minha autocomiseração. Uma inexistência que machucava, mas ninguém morreu. É um velório sem defunto. Eu era daquele homem, ele era meu, e não era amor, então era o que? Dizem que as pessoas se apaixonam pela sensação de estar amando, e não pelo amado. É uma possibilidade.

Eu estava feliz, eu estava no compasso dos dias e dos fatos. Eu estava plena e estava convicta. Estava tranquila e estava sem planos. Estava bem sintonizada. E de um dia para o outro estava sozinha, estava antiga, escrava, pequena.

Parece o final de um amor, mas não era amor. Era algo recém-nascido em mim, ainda não batizado. E quando acabou, foi como se todas as janelas tivessem se fechado às três da tarde num dia de sol. Foi como se a praia ficasse vazia. Foi como um programa de televisão que sai do ar e ninguém desliga o aparelho, fica ali o barulho a madrugada inteira, o chiado, a falta de imagem, uma luz incômoda no escuro. Foi como estar isolada num país asiático, onde ninguém fala sua língua, onde ninguém o enxerga. Nunca me senti tão desamparada no meu desconhecimento.

Quem pode explicar o que me acontece dentro? Eu tenho que responder às minhas próprias perguntas. Eu tenho que ser serena para me aplacar minha própria demência. E tenho que ser discreta para me receber em confiança. E tenho que ser lógica para entender minha própria confusão. Ser ao mesmo tempo o veneno e o antídoto. Se não era amor, Lopes, era da mesma família. Pois sobrou o que sobra dos corações abandonados. A carência. A saudade. A mágoa. Um quase desespero, uma espécie de avião em queda que a gente sabe que vai se estabilizar, só não sabe se vai ser antes ou depois de se chocar com o solo. Eu bati a 200Km/h e estou voltando a pé pra casa, avariada.

Eu sei, não precisa me dizer outra vez. Era uma diversão, uma paixonite, um jogo entre adultos. Talvez seja este o ponto. Talvez eu não seja adulta suficiente para brincar tão longe do meu pátio, do meu quarto, das minhas bonecas. Onde é que eu estava com a cabeça, de acreditar em contos de fadas, de achar que a gente manda no que sente e que bastaria apertar o botão e as luzes apagariam e eu retornaria minha vida satisfatória, sem sequelas, sem registro de ocorrência?

Eu nunca amei aquele cara. Eu tenho certeza que não. Eu amei a mim mesma naquela verdade inventada. Não era amor, era uma sorte. Não era amor, era uma travessura. Não era amor, era sacanagem. Não era amor, eram dois travessos. Não era amor, eram dois celulares desligados. Não era amor, era de tarde. Não era amor, era inverno. Não era amor, era sem medo. Não era amor, era melhor.”

Martha Medeiros, Divã.

8 Comentários ♥:

wcastanheira disse...

Uuau fcar cega depaixão, viver algo q não é amor, porém na hora parece muito mais q amor, são as doces loucuras, os belos delírios da carne, sem explicação, mas c/mto prazer, é ótimo, pra vc minh abela poetiza bjos, bjos e bjossssssssssss

Fique mais um segundo... disse...

Oi, Gisele, bom dia!!
Se havemos de tentar medir, se havemos de tentar descrever, se havemos de tentar explicar, é preciso saber que havemos antes de compreender: que há maiores e menores; que menores não hão nunca de conseguir medir, descrever ou explicar maiores com sucesso; que entre a razão e o sentimento humano, o sentimento é maior; que, portanto, a razão não o explica; que nos resta tentar o não recomendável; que nos resta tentar dizer o indizível... Então, surge um texto assim, belo, lindo, intenso, carregado, deslumbrante, mas que ainda é uma simples confissão de incapacidade de descrição... Era amor? Ou era maior que o amor? Não tinha os padrões clássicos do que dizem do amor... Mas, os que falam do amor, conhecem verdadeiramente uma explicação para o amor?...
Ah... O amor, o amor, o amor... Continuamos sem entendê-lo, dimensioná-lo ou descrevê-lo... Porque ele é maior que nós!
Mas senti-lo!... Isso já é outra história... e outra poesia...
Um beijo carinhoso
Doces sonhos, menina
Amo seu blog

Luana Natália disse...

Olá! Quanto tempo, hein!?

Já ouvi dizerem uma vez que o verbo amar não devia ser conjugado no pretérito, e acredito piamente nisso. Não existe isso de "amei Fulano um dia", porque amar é para sempre. E a gente sofre com os fins de relacionamentos simplesmente porque quer deixar de amar e não pode, quer parar de sentir aquele sentimento e não consegue. Deixar de amar não deixamos, o que conseguimos fazer é enterrar aquele amor o mais profundo possível, tentar esquecê-lo. Por isso que, volta e meia, nossos pensamentos se voltam àquela pessoa que não vemos há muito tempo, porque, seja lá onde for, aquele sentimento gostoso ainda está escondido dentro de nós mesmos.
Amo a Martha!!! Linda escolha para pôr no seu blog, viu?

Beijos para ti :)

Unknown disse...

Que lindo.

"nao era amor, era melhor"

passei por isso.. e foi perfeito, mas acabo.. =/

beeijos flor

Júlia disse...

É, era muito melhor que amor...
Martha e seus textos lindos.

Beijos :*

J. F. M. M. disse...

Belas fotos!
Saudações da Espanha.

Fernando Santos (Chana) disse...

Belo texto...Espectacular....
Cumprimentos

sawuelbruno™ disse...

nossa ... bem profundo esse texto,

muito bem escrito, uma leitura agradável e que nos prende em curiosidade ate o final.

Parabens pelo texto Gisele.
Abraço.

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Beijos!

Gisele Braga

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